9.2.06

Comunicação, Internet e Revolução

O Evaldo Shinji Kuniyoshi me perguntou ontem no Orkut, no tópico Virou moda agora falar mal das pessoas da comunidade Cibercultura, se

seria muita ingenuidade acreditar numa terceira opção (a la Pierre Levy)?: sistema inteligente e usuário inteligente, para fazer com as tecnologias disponíveis (pode ser até do Bill Gates e do Google) um coletivo que trabalhasse de modo sinérgico os sistemas de carbono? Ou estamos fadados a repetir indefinidadamente os processos de dominação e controle???

A primeira resposta que eu dei dizia que

Soa legal

Mas o fato é q se o sistema é inteligente, tipo o formigueiro, o usuário padrão deve ser burro como a formiga pro sistema funcionar bem. Um usuário inteligente ou se confunde com uma função do sistema, ou se transforma numa perturbação que deve ser eliminada. E a rede de TV é um sistema inteligente e impermeável, pois produz um usuário estúpido. Basta pensar na emergência do video cassete que permitia fazer da TV uma rede aberta interativa. Acabou sendo usado pra replay e reprodução. Como dizia McLuhan: o meio é a mensagem.

Sobre os sistemas centrados no usuário tem 2 artigos ótimos do Reed sobre isso:

SALTZER, J. H., REED, D. P. e CLARK, D. D. (1988) End-to-end arguments in system design, In: PARTRIDGE, C. (ed.) Innovations in Internetworking, Norwood, MA: Artech House, pp. 195-206.

SALTZER, J. H., REED, D. P. e CLARK, D. D. (1998) Comment on Active Networking and End-to-end Arguments, In: IEEECommunications Magazine, 12, 3, (Maio-Junho) pp. 69-71.

Depois da resposta fiquei pensando que podia parecer que eu considerava o que ele tinha dito ingenuidade ou bobagem. E não era nada disso. Pelo contrário. Ele

Não falou bobagem nenhuma

Fez uma pergunta ultra pertinente. De fato uma pergunta pra lá de importante. Na metafísica, quando se usa a hipótese deus o problema é exatamente este. Nas religiões de deus único esse problema tb está presente. Se o sistema é auto-suficiente pra que fazer elementos inteligentes? - se pergunta o pecador (e como professor em forum público devo falar a linguagem do "pecador"; a linguagem da ciência).

A turma da equivocidade transcendente, da hipótese relojoeiro cego, se compraz no conservadorismo. Se tudo é acaso e necessidade, e o acerto depende do acaso depurado por bilhões de anos de aleatoriedade, louco é quem quer mudar alguma coisa e acredita saber o valor da mudança. Melhor conservar o acerto bilionário, pois a evolução é imprevisível. O certo é eliminar as aberrações da aleatoriedade do sistema - eliminar o risco - para "melhorar" a obra da criação.

Mas o que Reed esta dizendo, ao apregoar uma rede centrada no usuário é o mesmo que os bem-aventurados do entendimento já diziam: não há diferença de escala entre sistema e usuário - o mundo é vontade de potência -; os melhores usuários inventam o sistema - o ser se diz numa só voz de tudo aquilo que dele se diz -; a maioria "medíocre" e conservadora se dilui na repetição do sistema - o eterno retorno é seletivo e só retorna o que tem potência para retornar, só retorna a diferença (Oswald de Andrade já dizia: a alegria é a prova dos nove do eterno retorno).

Claro que nenhuma destas "proposições" podem ser provadas cientificamente, e aí as brumas e o terror dos discipulos de Wittgenstein mandam todos calarem a bôca (o que não se pode falar deve se calar).

Mas não é pq uma imensa massa de "pecadores" prefere viver no ódio a deus (sistema) e ao mundo (multiplicidade) - ou seja, prefere viver no ressentimento - que os bem aventurados vão abdicar de viver amando a si, a deus e ao mundo ao mesmo tempo, independente do disparate científico disso. De fato o sistema "estúpido" é o paradoxo do deus bondoso que gera criaturas inteligentes; o paradoxo do deus que se realiza na realização do que existe e acontece.

O que não pode ser provado, pode ser entendido, tem sentido e fala.

E o diabo?

Nietzsche já ensinava: o diabo é o ócio de deus a cada 7 dias....

Evaldo dixit

li o segundo texto (é mais fácil de entender!). Eu respondí

O segundo texto

Vc tem razão em dizer q ele é mais claro.

No primeiro texto eles estão defendendo princípios de criação de sistema bastante inaceitáveis; recebidos de fato entre muxoxos e ceticismo. Foram "aceitos" pq ninguém acreditava na Internet como um sistema de uso pela massa; ele só devia ser usado por milicos, phds, técnicos de alto nível...

Mas Tim Berners-Lee inventou o www e a Internet "explodiu" em 1995.

O segundo texto é de 1998 e recolhe os acertos da decisão. Quando eles escreveram o primeiro esse princípio estava sob ataque e nada havia de forte que corroborasse essa decisão. Qdo escreveram o segundo o princípio estava sob ataque de novo - e hoje está sob o mais violento dos ataques - mas eles já tinham o www para corroborar o seu acerto, podiam falar com mais clareza e firmeza.

Evaldo again

Tenho um enorme interesse na formação de redes sociais. Eu respondí

Lei de Reed, Comunicação e Parceria

Tem 2 textos do Reed, científicos e importantes pra entender a Internet como lugar de produção de redes sociais. Reed é fera, e conseguiu regar a bem aventurança com matemática, de lambugem explicando matematicamente um velho axioma de Marx (o axioma q diz que a burguesia não pode se organizar no comércio sem organizar tb o trabalho q vai subjugar o capital - esse axioma é a base de todo otimismo revolucionário pois é o que dá "cientificidade" pra revolução).

A lei de construção de comunidade através de rede comunicacional é chamada "lei de Reed", em contraposição a lei de Sarnoff (o valor da rede comunicacional unidirecional é a quantidade de nós conectados, vulgo audiência), e a lei de Metcalfe (em uma rede de comunicação interativa o valor da rede é a quantidade de nós elevada ao quadrado - ou seja o valor da rede é o valor da oportunidade de interações/negócios - eu brinco q é a lei do B2B).

A lei de Reed reza q o valor de uma rede interativa de comunicação distribuída é 2 elevado ao número de nós, ou seja a parceria exponenciada pela oportunidade de agrupamento.

Pela lei de Metcalfe fundir redes aumenta a oportunidade de negócios - o seu valor comercial - pois 2 redes de 5 nós (5 elevado ao quadrado + 5 elevado ao quadrado=50) valem menos que uma rede de 10 nós (10 elevado ao quadrado=100). Mas o valor dos negócios não cresce sem fazer crescer tb o valor da cooperação, o P2P, o valor da construção de comunidades (2 elevados a 10=1024).

REED, D. P. (1999) Digital Strategy: Weapons of Math Destruction, In: Context Magazine, Chicago: Diamond Cluster International, n.º 3. (Spring)

REED, D. P. (1999a) That Sneaky Exponential – Beyond Metcalfe’s Law to the Power of Community Building, In: Context Magazine, Chicago: Diamond Cluster International, n.º 3. (Spring)

8.2.06

O Controle Como Dispositivo

Como descobrir e processar em um tempo finito onde está a informação q vc precisa num universo de informação "infinita"? No Idea - grupo de pesquisa da ECO/UFRJ - em 1998 o Paulo Vaz percebeu que o problema da informação ilimitada e inumerável era a geração desta distância cognitiva. Os motores de busca e a tecnologia dos agentes foram as respostas encontradas na Internet pra esse problema, gerando as empresas do virtual: empresas que descobrem, qualificam e promovem o enriquecimento de um universo qualquer de informação e conhecimento (Amazon, Ebay, Google, etc). O CiberIdea foi criado com o projeto que explorava as consequências da distância cognitiva na Comunicação.

Nas máquinas vivas de carbono o modo de selecionar são os canais de percepção e o sistema sensório-motor que liga o percebido a uma reação motora. O desenvolvimento da inteligência sobrecodificou esse sistema com sistemas semióticos que relacionam uma grande diversidade perceptiva aos conceitos, gerando o sistema simbólico como suporte do entendimento.

Supondo que o meio é a mensagem estamos nos convertendo em agentes para lidar com o universo cognitivo que estamos produzindo. A melhor das hipóteses, partindo desse pressuposto, supõem que somos ativos em um sistema estúpido que se deixa customizar. Na pior das hipóteses o sistema é inteligente e somos apenas terminais estúpidos, consumindo a informação que nos é destinada e reagindo a ela como programado - relógios processados por un relojoeiro cego. O controle como dispositivo de poder é a reunião da primeira e da segunda hipótese.

O dispositivo do controle

O contrôle operaria a partir da distância cognitiva. Como positividade ele vale pelo que produz. Ele constitui um sistema que permite 2 tipos de operações: você se constitui controlando as variáveis do sistema (sistema estúpido + usuário inteligente) ou o sistema controla todas as variáveis e te constitui como ele bem entende (sistema inteligente + usuário estúpido).

De fato isto não é uma alternativa mas uma oscilação permanente. O dilema próprio ao contrôle. Para poder controlar bem algo eu preciso descontrolar (se diz desregulamentar ou desregularizar) outro algo. E eu sofro o efeito da desregulamentação/descontrole.

Por isso o vício esta no cerne da compreensão do fenômeno, substituindo a velha noção de necessidade. Toda necessidade é vista como um vício, ou seja um problema de controle do sistema. Se o sistema usa o vício pra controlar, no modêlo sistema inteligente e terminal estúpido, o vício total implica descontrôle - o viciado se torna incontrolável. O que não quer dizer libertação do viciado, mas problema para o sistema que encontra um limite para a utilização de seus recursos. Burroughs é muito claro a esse respeito no Almoço Nú e continua sendo uma das melhores fontes para entender a montagem do dispositivo.

Ele permite repensar o modelo dos negócios pelo mercado da droga. A droga como mercadoria ideal, o vício como modelo ideal de comércio. Só para exemplificar Bill Gates viciou todo mundo em DOS e depois sintetizou a droga como Windows - o Windows como droga pesada, que nem a heroína. A primeira dose é sempre grátis...

Agentes na Política Brasileira

FHC engrossou o caldo do impeachment contra o Lula na entrevista pra Isto É quando disse que ou ele sabia do mensalão ou é incompetente pra exercer o cargo. Todo mundo sabe q ele e o Serra coordenam a campanha joga merda no PT usando o PFL como agente - no sentido usado abaixo -, ou laranjas como a nossa imprensa gosta de usar. O que o esta obrigando a se expôr é o apoio popular ao Lula, contra toda orquestração da mídia e da classe média locupletada. O artigo dele no globo, falando das eleições e convocando o início da campanha mostra o que está incomodando o PSDB. Nunca faltou a FHC a certeza do apoio da meia dúzia de famílias dominantes, mídia e classe média locupletada. Ele vendeu a telefonia brasileira pro atual presidente do seu partido, o PSDB, sem que se ouvisse qualquer muxoxo na mídia sobre corrupção. Mas algo deve estar fazendo a diferença agora. Eu acredito que essa diferença pode estar sendo feita pela comunicação distribuída, vulgo Internet, que o governo usa muito bem - não fosse o IBASE/ISER /Rits o inventor da criança em solo pátrio. O problema no Brasil é aferir a intensidade e o alcance da Internet. Eu estou tentando aprender como se faz isso aqui em Toronto, para, se os santos ajudarem, montar um lab na ECO. De qualquer modo alguma coisa esta fora de ordem na velha ordem brasileira pra obrigar o doutor Cardosa - como Larry Rohter do New York Times o chamou na reportagem Yes, Investors Panicked. But Brazil Didn't de 23 de maio de 1999, aludindo ao descarado apoio dado por ele e o PSDB às teles espanholas na privatização da telefonia brasileira - a agir e falar como o velho haciendero latino americano.

Burn, Baby, Burn

Estou escrevendo desde ontem turbinado pelo CD/Sampler Best of Bootie, dica do Boing Boing na nota 20 best mashups of '05. É só baixar, ouvir e queimar.
BTW
Os BOOTLEGGER LINKS do Best of Bootie são ducacete. Uma mina de ouro....
E...
A capa do CD é uma obra prima de CV, como os sampler do disco. Sente só a arte!

Videobomba: editor de video canal social e ferramenta de busca

Uma nova ferramenta para um dublê de vídeo, lista de reprodução e publicação foi desenvolvida pela Participatory Culture Foundation - o mesmo pessoal que nos deu o DTV - permitindo qualquer um fazer seu canal de televisão na Internet. O nome do treco está a altura da descoberta: Videobomba.Enquanto os regulamentadores conspiram para transformar a Internet em uma defunta TV, os desregulamentados fazem da Internet uma TV aberta com bilhões de canais!!! Leia + no Boing Boing.

6.2.06

Os Agentes e a Verdade na Comunicação Distribuída

Estaria o velhor ator social da modernidade se transformando? A noção de agente de rede parece ser algo além do funcionamento de um dispositivo de motor de busca amparado em um princípio geral de funcionamento de sistema de inteligência. A adoção dos agentes significou o abandono da idéia de inteligência individual auto suficiente adotada pela IA. Muitas inteligências limitadas mas capazes de se comunicar e aprender, centradas em uma missão, se revelavam um sistema de inteligência mais capaz e eficiente que o velho cérebro consciente individual. Com isso se resolvia ao mesmo tempo o problema de como localizar e processar uma informação em um sistema saturado de informação a cada momento. Mas resolver esse problema não significaria que o sujeito social se transformara, deixando de ser um ator e tornando-se um agente?

O mundo dos agentes

Nvídia está sendo acusada de contratar agentes online para criar dúzias de avatares em foruns online, onde eles ganham a confiança dos jogadores comentando assuntos não relacionados aos produtos Nvídia de modo a submergí-los em uma orgia de comentários sobre o material da Nvídia.

O forum de notícias do Penny-Arcade recebeu uma msg sobre marketing de guerrilha de um anônimo que dizia:

Eu fui entrevistado por um negócio de marketing de guerrilha em São Francisco que tinha como alvo as teias de foruns.

Me disseram que se eu aceitasse o trabalho, eu tinha de ter PELO MENOS 50 identidades na maior quantidade de foruns que eu pudesse (eles queriam de fato 100), com um objetivo de 5 mensagens publicadas por hora. As mensagens teriam de ser planejadas, e a idéia era de que eu estabelecesse múltiplas identidades com uma história nos foruns, de modo que quando a hora certa chegasse uma mensagem de marketing bem escrita e sutilmente relacionada fosse educadamente publicada. E os usuários regulares reconheceriam a mensagem como sendo de um velho e confiável freqüentador.

Leia o texto completo no Boing Boing.

A verdade dos agentes

O interessante nessa matéria para mim é a reiteração do funcionamento da verdade na Internet, ou seja, a transformação do sistema de reputação social. Como o próprio depoimento aponta, alguém precisa ter uma história de serviços prestados em um fórum (comunidade virtual) para dizer algo q seja considerado verdadeiro. O que faz dos avatares da Internet agentes sociais, ao invés dos velhos atores sociais da modernidade. Eles não tem um papel a desempenhar, mas uma missão a cumprir. Pode-se com razão dizer que é algo criminoso. Mas é um crime na perspectiva moderna do ator social que tem um papel e que deve o desempenhar verdadeiramente, sob o risco de ser acusado de fraude (171) quando identificado. A verdade das missões dos agentes é medida pelo seu sucesso e não pela identidade do agente ou pelo conteúdo transmitido.